sexta-feira, 8 de junho de 2018

SOBRE A FOME (Eliana Haesbaert)

“Se lhes falta o pão, que comam brioches!”

Esta frase famosa, atribuída à Maria Antonieta, é uma falácia. Ela era fútil e supérflua, mas não uma idiota.
Tenho convicção de que a pessoa que – felizmente – nunca passou fome não pode e nem sabe falar sobre ela. Tudo soaria falso.
A mais terrível história real sobre a Fome de que tomei conhecimento foi no livro “Seis Mil Anos de Pão” de Heinrich Eduard Jacob, que conta de uma aldeia medieval na região do centro europeu, quando a Europa ainda estava  em formação (na região por onde hoje se localizam Holanda, Alemanha, Áustria e Luxemburgo), onde a base alimentar era a batata, sofreu uma praga terrível em que toda e qualquer plantação de batatas apodreceu e pretejou. A pequena população local sobreviveu parcamente, “liquidando” a  única colina  que existia no local, comendo toda a terra da elevação.
É uma narrativa cujos detalhes são assustadores e maquiavélicos.
Mas existem outras fomes, falando metaforicamente...
Quando eu trabalhava no Centro de Florianópolis, certa vez, andando pela Rua Tenente Silveira, uma mulher indigente, creio que na faixa dos 30 anos, abordou-me pedindo dinheiro para comer e dizia estar com muita fome. Disse-lhe que entrasse comigo numa lanchonete para escolher aquilo que quisesse comer daquilo ali exposto.
Ao chegar ao balcão vitrine, ela havia sumido. Simplesmente escafedeu-se. Entendi que sua fome era de outra coisa.
Minha última “proximidade” com a fome foi há poucos dias, durante a greve do transporte de cargas, ao ouvir a notícia chocante sobre o iminente canibalismo entre as aves de cativeiro da indústria pela falta de ração e grãos que os alimentam.
Poderia ficar dissertando sobre o óbvio e que foi bastante enfocado aqui no nosso último encontro: a carência de nutrientes vitais para o desenvolvimento do ser humano, desde a formação do feto, durante o crescimento na infância que provocam a dislexia e as demais doenças e incapacidades geradas pela desnutrição, mas seria lugar comum.
Por me sentir incapaz de escrever sobre a Fome, prefiro citar uma fome que todos nós já vivemos em algum período das nossas vidas: a fome do amor apaixonado, que consome e desequilibra a estrutura emocional de qualquer vivente.
E, agora, a fome que alimenta nossos espíritos e mentes: a Fome de Livros destes Náufragos Literários.




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