
Autor: Hélio Cervelin
São cinco horas da tarde no Sul
do Brasil. A chuva fina cai,
insistentemente, trazendo consigo uma brisa fresca que contrasta com o forte
calor que reinara desde a manhã. Olho para o horizonte e vislumbro as colinas
verdejantes recobertas de neblina da Ilha de Santa Catarina e começo a divagar
sobre a força e as nuances da natureza, em suas múltiplas manifestações.
Permaneço nessa contemplação e percebo
o quase silêncio, quebrado apenas por rajadas intermitentes de um vento mais
forte. Enquanto isso fico imaginando o que estará acontecendo em outros lugares
deste meu conturbado país, em grandes metrópoles como Rio de Janeiro, São
Paulo, Salvador, Belo Horizonte e Porte Alegre: as rajadas certamente serão diferentes:
metralhadoras, fuzis e revólveres insistindo em mostrar "trabalho",
acionadas por mãos de insanos, cujas mentes são inspiradas e comandadas por
outras mentes insanas e egoístas que a tudo desejam conquistar por meio da
violência e da morte, não se importando quantas lágrimas irão rolar, quanto
sangue irá jorrar e quantos órfãos e viúvas irão produzir.
Na imensidão deste país, neste
mesmo momento, o silêncio também predomina nas regiões agrícolas altamente
produtivas como o Centro-Oeste (Goiás, Mato Grosso, Tocantins) e suas grandes
plantações de soja e no Sudeste e no Sul, com suas vastas extensões de
plantações e pastagens para a criação de gado.
E em nossa Amazônia, o que estará
acontecendo? Vastas regiões de florestas verdes, rasgadas por águas sem fim, na
forma de sinuosos rios e cascatas, comportando os movimentos de animais
silvestres, incluídas as mais diversificadas espécies de pássaros. Além da
fauna, uma flora das mais exuberantes, esperando sobreviver aos ataques do
homem moderno, que a tudo destrói e que tudo precifica. Os chamados
"ribeirinhos", povos indígenas e mestiços que habitam essa vasta
região, certamente estarão neste momento retirando da água o seu sustento e a
sua sobrevivência.
Das regiões montanhosas como as
serras catarinense, mineira e fluminense, posso ouvir o murmúrio das cachoeiras
escorrendo, avolumadas pela chuva recente. Na Serra do Mar, onde o clima é
costumeiramente mais frio, a brisa açoita a vegetação, forçando os animais
e as aves a buscarem um lugar mais
quente para se abrigarem.
E o Nordeste brasileiro, onde a
chuva é escassa e a terra seca é uma característica, o que estarão fazendo os
sertanejos? Olhando para o céu em busca de nuvens, pedindo a Deus que se lembre
de mandar chuva para que suas plantações vinguem? Olhando para os açudes e
vendo-os minguarem a cada dia que passa? E a cacimba quase seca, que fornece a
água que as famílias tanto necessitam, quando refluirá?
Enquanto isso, do interior de
seus ambientes luxuosos e bem refrigerados, governantes milionários e
milionários governantes desfrutam de seus ares condicionados, em mesas regadas a
vinhos, uísques e iguarias da melhor qualidade, banhando-se em piscinas azuladas, de águas límpidas e bem
tratadas.
A poucos quilômetros dali e nesta
mesma hora, um grupo de pessoas malvestidas e malnutridas segue em procissão
rumo a um cemitério quase em ruínas, levando o corpo de uma mulher assassinada
pelo marido, Acompanhado por um séquito de maltrapilhos que compõem o seu núcleo
da amizade e relacionamento, o féretro segue lento, cantando chorosas canções,
invocando a Deus e à Virgem Maria. Uma cova de sete palmos está à sua espera, e
o seu trajeto neste planeta estará consumado da forma mais violenta e
deplorável.
Este é o meu país, comandado por
uma elite déspota, egoísta e sanguinária, que nada mais vê a não ser o seu
próprio umbigo; que mente e engana, descaradamente, para obter mais e mais
benesses; que chafurda na lama do tráfico, da corrupção e da mentira; que consegue
cooptar as consciências, procurando
eliminar todo e qualquer indivíduo ou grupo de indivíduos que possam vir a
atrapalhar os seus sonhos de um Brasil fértil, próspero e totalmente dominado
pela sua ganância para o seu próprio desfrute.
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