
Autor: Hélio Cervelin
Sou brasileiro e sou
covarde. Jamais lutaria como lutam outros povos ao redor do mundo, com destemor
e valentia. Tenho medo de lutar pelos meus direitos, o meu grito está preso na
garganta e não consigo esboçar qualquer reação, desde séculos atrás.
Aqui nas Américas, vejo
os chilenos derramando seu sangue ao encararem balas de borracha, cassetetes e
spray de pimenta, esperando redemocratizar seu país; vejo os bolivianos
lutando noite e dia, contra a opressão, a escravidão, o preconceito, a fome, a
miséria, arriscando-se e morrendo para restabelecer a democracia solapada por
um golpe de Estado, negado pela direita
local e internacional; vejo os equatorianos derramando seu sangue em nome da
liberdade de seus cidadãos. Vejo os argentinos impondo mudanças pelo voto.
Olho ao redor do mundo
e vejo os habitantes de Hong Kong arriscando suas vidas, enfrentando armas de
fogo, em nome de um ideal. Em Paris vejo
homens e mulheres arriscando suas vidas ao lutarem contra atos governamentais e
a favor da Ecologia.
Aqui, no meu país, vejo
a floresta ardendo em chamas, e nada faço; vejo o petróleo poluindo as praias
mais lindas do mundo, e nada faço; vejo
minha cidadania indo para o brejo, e nada faço; vejo os meus direitos
trabalhistas e sociais sendo extintos, dia após dia, e nada faço.
O que acontece comigo?
Por que não luto pelos meus direitos, para preservar minhas conquistas?
Mas, eu não consigo
fazer isso. Sou covarde, sou brasileiro, sou arrogante e me considero superior,
mesmo usando o limite do meu cheque especial e pagando a conta do meu cartão de crédito em parcelas, a juros
altíssimos, estratosféricos.
Nas eleições, dos
candidatos a presidente, desprezei o
filósofo e professor, jovem
conhecido e experiente, que me prometeu dignidade e justiça e escolhi o que
defende a tortura, a supressão dos direitos humanos, a repressão aos trabalhadores
e às organizações sociais, defensor da homofobia, do racismo, do preconceito. Desprezei aquele que ainda está
no mesmo partido desde que se filiou, há décadas, e foi consagrado como
prefeito da maior cidade da América Latina, e escolhi aquele que já mudou
de partido oito vezes. Desprezei aquele
que prometeu manter os empregos e
escolhi aquele que defende apenas os empresários e é favorável à precarização
do salário mínimo e das aposentadorias, esquecendo-se de que, sem consumidores,
não há capitalismo.
Sou brasileiro e aplaudo
a burguesia, sua pujança, suas farras, seus exageros, suas viagens de iate,
seus passeios a Miami, suas fotos
glamorosas nas revistas caras, e olho com desdém os meus pares da classe média,
trabalhadores, as pessoas humildes, os
gays, os garis, os garçons.
Sou um brasileiro
covarde, explorado, sem consciência política, ou seja, desconheço os meus próprios
direitos, acredito na mídia podre, especialmente a Rede Globo; qualquer pastor
evangélico improvisado me leva na conversa; tenho baixa autoestima, tenho
complexo de vira-lata, enfim, sou um inocente útil, um covarde assumido, que se
contenta com as migalhas que caem das
mesas dos abastados deste país.
Belo texto. Honesto, objetivo. Gostei do texto embora não tenho gostado do que a leitura me fez pensar a meu respeito.
ResponderExcluirHelio... bem real... sincero... verdadeiro
ResponderExcluirQ pena que estejamos assim
acovardados..
q pena.
Verdade, Isabel. Uma pena.
ResponderExcluir