terça-feira, 28 de maio de 2019

NOITES DE LUA CHEIA (Hélio Cervelin, 28maio2019)



Autor: Hélio Cervelin

Como esquecer aquelas noites de lua cheia, prateada, iluminando as montanhas e campinas de uma região do Oeste de Santa Catarina, em um município chamado Ouro?
Lua que clareava as pastagens perto de minha casa, onde as sombras dos bois que descansavam os transformavam em seres estranhos, balançando suas cabeças para se livrarem de algum inseto enxerido. Era extasiante olhar  para aquele pé de Ipê Amarelo, majestoso, enfeitado por suas belas flores amarelas, cujo dourado se acentuava pela ação dos raios da lua.
Olhar pela janela de madrugada em uma noite de  lua cheia era contemplar o silêncio. Silêncio que, hoje,  nestes dias tão corridos e perturbados, se revela tão raro e precioso. Não há nada que se compare a uma noite enluarada, em um sítio distante e silencioso. O mundo parecia ter parado, à espera de contemplação. Assim fica fácil entender por que tantas e tão belas canções foram inspiradas nas áreas rurais do interior deste imenso  país.
Entretanto as épocas mudaram. Muitas dessas imagens, outrora tão bucólicas, deram lugar às   monoculturas, e essas terras foram subjugadas pelas potentes e barulhentas máquinas agrícolas, que as rasgaram sem dó. O gemido das pererecas nas lagoas agora deu lugar ao pipocar dos motores a explosão, inundando as vargens e vales adjacentes, processando cereais, refrigerando ambientes. A energia elétrica invadiu também o campo. O chamado progresso chegou à roça!
Aquelas vaquinhas que se aproximavam do estábulo todos os domingos para lamber o sal, estrategicamente colocado para elas, já não aparecem mais. Os pássaros coloridos que costumavam pousar nas imediações para aproveitar os restos de cereais caídos ao chão, já não estão mais. Os sítios mudaram, a vida no campo mudou!
O rangido dos carros de boi e o canto dos pássaros e dos galos nas madrugadas desapareceram. E com eles também desapareceu a inspiração para criar modas de viola e lindas canções caipiras, típicas do interior. Em seu lugar surgiu o ronco dos tratores, quebrando o silêncio das campinas e inundando os ouvidos dos últimos caipiras. Os  poucos pássaros que ainda restam, povoando as poucas árvores, distribuídas aqui e acolá, emudeceram. Os cavalos marchadores foram praticamente dispensados da lida do campo, dando lugar ás motocicletas e aos automóveis.
E a palavra que mais nos vem à mente é "saudade". Ou, como diria o velho caipira: "Sodade". Sim, saudade, nostalgia daquela simplicidade que nos bastava a todos e nos trazia paz e alegria. Éramos simples, e nos satisfazíamos com coisas simples, naturais, tais como o leite tirado da vaca todos os dias; o queijo e a nata feitos pelas nossas avós, com carinho e dedicação; os pães sovados em casa, na base do esforço físico e assados em enormes fornos fora da casa; as geleias das frutas colhidas no quintal; as frutas, apanhadas e degustadas na hora.
O mundo mudou. Mudou para melhor em muitos aspectos, mas em outros tivemos perdas. Como fazer para usufruir de cada coisa, cada situação, cada momento apenas o seu melhor? Será isso possível?

Música: LUAR DO SERTÃO ( Tonico e Tinoco)

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