Este livro, de autoria de Tavae Raioaoa, conta a história de
um pescador, considerado um dos últimos de sua linhagem de
“senhores do mar”, que, embora conhecesse o mar e tivesse uma fé
imensa no Criador, um problema no motor de seu
barco o deixou à deriva. O
livro começa descrevendo o vento:
O velho
pescador na madrugada daquele dia percebeu que o
vento que soprava era o vento do norte. Ele sabia que o vento do norte
surpreende o mar, de viés, e o contraria, e o agita e o ergue incansavelmente,
provocando turbilhão de espumas e isso excita os
peixes. Agradeceu ao senhor pela pesca que prometia ser
excepcional naquele dia.
A região em que ele
estava é o largo da baía de Pao Pao – a grande baía
de Moore (Polinésia Francesa) que está voltada para Huahine (sua cidade ) -
e ia em direção ao Taiti. A princípio não ficou nervoso,
pois desde que nascera, havia passado mais tempo no mar do que em
terra. Tentou contato com seu irmão e parceiro de tantos
anos que também pescava em outra região, mas ele não
respondeu. Pensou que talvez estivesse fora do alcance, pois o
vento o levava para mar adentro.
O peixe que ele busca se chama
mahi-mahi. São dourados do mar que pesam em torno de dez quilos. Ele
detalha como consegue, numa caçada frenética no mar, cansar o
mahi-mahi a ponto de ele se imobilizar por um
segundo e é aí que ele lança o arpão. Depois é só trazê-lo para
dentro do barco.
Naquele primeiro dia preparou os
mahi-mahi que pescou, cortando-os em fatias finas, as quais
pendurou por todo o barco para secarem.
Para que lado o vento o estaria
levando? Onde estava a civilização? Quando o sol foi embora, naquela
primeira noite, ele ainda estava sereno. Sabia que seria encontrado
pelos pescadores ou por cargueiros que fazem a rota das ilhas Fiji, da Nova
Zelândia e da Austrália. Vestia apenas um short e uma camiseta de
manga curta.
E naquela primeira noite sozinho no
mar ele se organizou para dormir um pouco e com os coletes salva-vidas que
tinha no barco fez seu travesseiro e colchão, mas antes de se deitar
decidiu lançar seu primeiro foguete luminoso, certo de que seria visto
imediatamente após o lançamento. Mas isso não aconteceu.
Quatro meses se passariam até o dia
em que ele veria luzes no horizonte novamente. Não haveria a menor chance
de sobrevivência não fosse ele um homem do mar acostumado às intempéries do
clima.
A descrição das tempestades em alto
mar, ver seu barco sendo jogado em alturas inimagináveis pela
violência das ondas, sentir que seu barco poderia se desmanchar, e virar
simples gravetos que boiariam no mar como ele já vira inúmeras vezes
mar afora. A solidão, o
cansaço, a fadiga e a exaustão, as longas conversas com o Senhor, com a
natureza, com os peixes, faz com que a leitura desse livro seja uma rica
experiência só vivida por um náufrago.
Finalmente, quando ele vê
as luzes, tem ainda que usar todas as forças que lhe
restam para levar o barco até terra firme... Um último esforço físico quase
que um último suspiro para um velho, magro e doente que outrora
fora tão forte.
E desceu cambaleando até onde havia
algumas pessoas. Perguntou num fio de voz: "Que lugar é esse?"
Ninguém respondeu. Continuavam falando e ele não entendia nada
do que falavam. E nisso apareceu alguém que respondeu na sua língua: "Ilhas
Cook ou Aitutaki, meu amigo".
-
De onde você veio e como?
-
Eu venho do Taiti.
- Taiti? Respondeu o homem. Mas
isto é muito longe. Deve ser mais de mil quilômetros. Como vieste parar
aqui?
O velho apontou para o barco atrás
do coqueiral. Já não tinha forças para conversar, e todos correram e
analisaram o barco, incrédulos. Começaram então a ajudá-lo. Um
trouxe uma toalha e esfregava vigorosamente seu corpo, outro trouxe uma
blusa e todos se alvoroçaram ao seu redor. Um prato de peixe
frito com banana taro, uru e regado ao leite de coco, como ele havia
sonhado tantas vezes, foi-lhe servido. E ele, agradecendo ao Senhor, tentou
comer, mas não conseguiu dar nem três bocadas. Um choro estranho
preso dentro de sua alma insistia em sair e o velho pescador chorou como
nunca havia chorado em toda sua vida.
O grupo de pescadores que agora
acreditavam em sua história, o carregaram no colo, como se carrega um bebê
, levando-o até um barco donde chegariam a um hospital.
Aí começa a ressuscitação do autor
e uma história de amor com este novo lugar abençoado que o acolheu.
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