
Autora: Áurea Wolff
Entre o silêncio do meu pai, a tagarelice da minha mãe e eu, pequena,
acontecia a rotina da nossa família.
Nas histórias contadas para mim, com muita graça, por minha mãe, as canções da sua época
eram repetidas em vários momentos. Aprendi e cantava com ela:
Pequeninha bem feitinha, delicada da cintura,
Eu não sei que sorte é esta, que amor contigo não dura.
Amor contigo não da que és muito namoradeira
Por uma perdes as outras, viverás sempre solteira
Viverá sempre solteira quem muito amor faz desmancho
No fumeiro da cozinha dependurada no gancho.
Dependurada no gancho que a todos quer namorar
Se namorasse a mim só comigo tinhas casado.
Comigo tinhas casado eu ai estava disposto
Agora caso com outra por ser muito do meu gosto
Por ser muito do meu gosto e tanto do gosto dela
Vou dar meu coração a uma bonita donzela .
Aos cinco anos de idade fui para a escola, que ficava na frente da nossa
casa. Aprendi todos os hinos ensinados pela professora: Hino Nacional, Hino à Bandeira, Soldados da
Pátria, canções religiosas e sertanejas. Cantava na escola e em casa.
À tarde, depois de fazer as tarefas, cantava sozinha sentada num balanço
feito por meu pai, com uma corda pendurada no rancho, onde a Gersinha dormia. Cantava
com toda a força as canções que
conhecia.
Passei a cantar no coral da igreja, aprendendo todas as músicas sacras e
as acrescentava ao meu ritual musical. Entre
estudar, ler, escrever, ajudar minha mãe nas tarefas de casa, meus cantos
estavam sempre como pano de fundo. Quando fiz o Segundo Grau, participei do
coral da escola, e cantava em casa as canções que aprendia.
Hoje, voltando o meu olhar para aquele tempo da minha infância e
adolescência, vejo a música como o meio de quebrar a solidão de uma casa, onde
habitavam a dor e a saudade de tempos cheios de alegria. E eu tinha, de modo
inconsciente, esta missão.
Vejo a música como uma sementinha que nasceu, cresceu e foi oxigenando a
minha existência com seus elementos
renovadores, através dos reflexos educativos e sentimentais contidos no embalo
dos sons e nas palavras belas das letras.
Cresci, casei e, de repente, tinha 5 filhos pequenos para criar e
educar. Recorri à música para fazê-los dormir, para canalizar sadiamente suas
energias e para dar leveza aos momentos
mais conflitivos e exacerbados.
Durante muito tempo os eventos
religiosos eram espaços onde liberava meus anseios e sentimentos, nas canções
comunitárias nos encontros e nas igrejas que frequentava.
Houve um momento em que a música brotava entre lágrimas e soluços,
forçada pela necessidade de atender às
necessidades de um ser pequenino, e servia ainda para aliviar as tensões e a dor.
A música na minha vida nasceu no silêncio, cresceu na simplicidade,
sobreviveu nas dores e mantém sua magia me impulsionando para dar vazão aos
sentimentos através do canto.
Com o passar do tempo ela criou força
e se revela na alegria da caminhada
e na gratidão a Deus pelo
milagre do amor que dá sentido a tudo que nos rodeia.
Canto para expressar com toda a força minha gratidão a Deus pela vida, e
para soltar a energia existente dentro de mim, que ainda teima em se espalhar
pela imensidão do universo.
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