
Autora: Delva Robles
Às vezes, coisas muito simples nos remetem ao passado. Hoje foram
bananas. Uma linda penca de bananas sobre a mesa me remeteu a um passado
longínquo.
Meu pai tinha uma atração por elas. Sempre tínhamos bananeiras plantadas
ao redor da casa onde morávamos. E quase sempre havia um cacho de bananas que
era colhido “diveis” (ou de vez, ou seja, no ponto onde deveriam começar a
madurar), e elas sempre amadureciam obedecendo a mesma ordem de nascimento.
Primeiro as mais velhas, depois as mais novas. Papai tratava com muito
carinho o cacho apanhado. Colocava-o num ambiente escuro para o
amadurecimento ser lento e as bananas não estragarem.
Minha infância foi partilhada com galinhas, vacas, cavalos, porcos,
carneiros, cabritos, cachorros, gatos, patos, gansos e até macacos.
Sim... minha avó tinha um macaquinho que ela adorava. Ele ficava preso a
uma corda, no quintal, e quando escapava, corria para o quarto dela e se
enrolava em seu pescoço. Sempre tivemos papagaios em casa. E nós
ensinávamos a eles todos os nossos apelidos, era muito divertido ouvi-lo nos
chamar. Geralmente eles sabiam também alguns palavrões que meus irmãos
mais velhos ensinavam a eles.
Havia um pomar imenso com laranjas, mexericas, poncãs, pinhas, amoras,
abacates, carambolas, mangas, mamões. Subíamos nos pés das frutas,
e lá saboreávamos na fonte.
Nos pés de abacate, que são mais altos, brincávamos de saltar de galho
em galho, como fazem os macacos. Brincadeira perigosa que nos
deu muitos tombos. Era assim: você se segurava em um galho e visualizava
outro galho que você iria pegar, então balançava o corpo como num trapézio e
bingo... soltava este e pegava aquele com precisão.
Havia também uma represa em que nadávamos todos os dias. E lá também
havia riscos enormes... Mergulhávamos e
passávamos por baixo de imensos galhos podres caídos no
rio. Além disso, havia o cafezal... longas filas de pés de café onde
brincávamos de esconde-esconde. Nos enfiávamos debaixo daqueles pés de
café sem nos importarmos com cobras, aranhas e escorpiões. O máximo que
nos acontecia - e isso era frequente - era pisarmos em pregos
enferrujados. Então mamãe mergulhava nossos pés em urina e cânfora e
amarrava um pano... um trapo, como dizia minha avó, a melhora viria em poucos
dias.
No terreiro ficavam os montes de café secando, cobertos com
encerados. E ao entardecer, no início da noite, muitas vezes sob a luz da
lua e das estrelas, corríamos descalças, rindo alto,
por aquele terreiro, subindo e descendo nos montes de café ou caçando vagalumes.
(vagalume tem tem... teu pai tá aqui, tua mãe também).
Ainda me lembro do prazer que sentia ao procurar e encontrar ninhos de
galinhas cheios de ovos. Era minha tarefa principal: colher os ovos nos ninhos.
Sinto o sabor do suco de amora... eu mesma as apanhava e as espremia na
peneira. Sinto o cheiro do pão sendo assado no forno a lenha, sobre uma
folha de bananeira... do curau, da pamonha, do doce de abóbora, de mamão, do
arroz doce com sabor de canela, do caldeirão cheio de leite, com
uma nata grossa e saborosa, sempre em cima do fogão a lenha.
Não me lembro de presentes no Natal. Lembro-me, neste dia, de mesa farta,
com muito vinho, músicas de Nat King Cole, Sarita Montiel, Miguel Aceves
Mejia, Cascatinha e Inhana e outros
artistas da época invadindo o ar, saindo pelas janelas abertas e perdendo-se na
vastidão dos cafezais em flor.
https://www.youtube.com/watch?v=xb09vF8siKU
Que infância maravilhosa você teve, Delva! Agradeça a Deus todos os dias por isso, pois são raras as pessoas conseguem ter uma infância assim.
ResponderExcluirHélio concordo com voce e eu sempre agradeço....mas.....são retalhos e retalhos une através da costura pequenas sobras que podem ser de seda ou de chita e algodão.
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