Autora: ÁUREA ÁVILA WOLFF
Minha família já
foi toda para o lado de lá, além da vida na terra, para um lugar que existe nos
sonhos e na fé de cada um. Neste lugar, acredito, estão as pessoas que fizeram parte da minha
caminhada, pessoas muito importantes e cada uma com um significado histórico e
amoroso diferente. Meus avós, tios e tias, primos e primas, meus pais, meus irmãos
e minha irmã, cunhados e cunhadas, meus sogros, sobrinho e meu marido.
Como sou temporão,
estou no final da fila, esperando o toque de retirada. A perda mais dolorosa e
mais recente foi do meu marido. Mas, sobre ele ainda é muito doloroso falar.
Quero falar sobre uma pessoa que viveu
no meu coração, com um rosto que eu pintei na galeria de fotos reais ou
fictícios, com uma personalidade que formei na imaginação, colhida nas
descrições familiares e na memória
histórica do tempo e do espaço. Meu irmão. Eu tinha 2 anos quando ele saiu de
casa com 17 anos e foi para longe; e eu
tinha 5 anos quando
a meningite ceifou sua vida. Marcante época escura da casa dos meus pais. Silêncio,
poucas falas, lágrimas, roupas pretas, vizinhos solidários. A dor dos meus pais
pela dolorosa perda me deixava sozinha e solitária. Inconsciente tristeza ao se
instalar na percepção infantil me proibia as manifestações alegres e as travessuras, que ficavam
fechando portas e janelas para o mundo colorido e bonito. E as falas cheias de encanto da minha mãe, num
desabafo amoroso e triste foram formando
no meu coração uma doce lembrança e terna saudade do Zezinho.
Quando escrevia
suas cartas, dizia minha mãe, sempre pedia para eu não dar palmadas na Aurinha
quando ela fugia para a casa do vovô. "Dá beijinhos no lugar das palmadas". Mamãe lembrava o carinho que ele tinha por mim; e que me
fazia dormir contando histórias, ninando na cadeira de balanço. E sorria, entre lágrimas, dizendo que num desses embalos
a cadeira virou comigo e com ele.
Ele era muito
bonito, dizia ela, tinha cabelos pretos e um gênio forte, alterado, e entrando
em brigas para defender alguém.
Inteligente e amoroso, alegre, iluminava
a casa com seus encantos e brincadeiras. Era forte e alto, trabalhador e muito responsável nos estudos. Era líder dos irmãos e dos jovens na escola e da
vizinhança. Criei para mim um irmão que, embora ausente, me amava muito; e com
esta visão terna guardo-o até hoje na minha vida.
Quando me sentia sozinha e pensava que
ninguém me amava, a lembrança do seu amor e carinho me enternecia e me dava
conforto para enfrentar as dificuldades do caminho. E eu pensava: "O Zezinho me ama. O Zezinho
me ama". E eu me sentia importante com esse seu amor.
Hoje minha
homenagem é para este irmão.
José, Zezinho, meu
querido, agradeço o carinho que tiveste para aquela tua irmãzinha tão pequena, porque serviu muito para ela
que guardou no coração o calor dos teus
afagos, que experimentou nos momentos difíceis os cuidados de um anjo da guarda, e nas recordações de
infância um companheiro amigo e forte a me proteger e me amar.
Tua partida precoce
deste mundo deixou para mim a saudade e a alegria de ter recedido teu amor, mesmo que somente através das lembranças da tua curta e tão brilhante história.
Hoje estou sozinha aqui na terra; nossa família de origem já não está
mais aqui. Sinto saudade de todos com quem convivi durante muitos anos e dos
quais recebi uma riqueza de valores e de força que me sustentam até agora. A
ti, irmão amado, ofereço a minha ternura e carinho e a homenagem de quem te
respeita e ama. E a certeza de que em
Deus está o teu lugar.
Porque Deus é
amor !
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